Mexe com o ego de muito nego
Os atos políticos
Se vistos por um viés psicanalítico
Nos últimos dez anos
A massa passa menos fome
Até a empregada come danone
O classe média tira visto pro estrangeiro
E junta mais dinheiro
Mas é claro que rico vai reclamar
Ele não é mais único que tira foto no mar
E a doméstica exige a carteira assinada
Pra parar de chão esfregar
quarta-feira, 22 de maio de 2013
segunda-feira, 13 de maio de 2013
A Gullar
Algumas manifestações já foram magistralmente feitas, como este poema de Ferreira Gullar, sobre a incansável dissertação da poesia.
A Poesia
Onde está
a poesia? Indaga-se
por toda parte. E a poesia
vai à esquina comprar jornal.
Cientistas esquartejam Puchkin e Baudelaire.
Exegetas desmontam a máquina da linguagem.
A poesia ri.
Baixa-se uma portaria: é proibido
misturar o poema com Ipanema.
O poeta depõe no inquérito:
Meu poema é puro, flor
Sem haste, juro!
Não tem passado nem futuro.
Não sabe a fel nem sabe a mel:
É de papel.
Não é como a açucena
Que efêmera
Passa.
E não está sujeito a traça
Pois tem a proteção do inseticida.
Creia,
O meu poema está infenso à vida.
Claro, a vida é suja, a vida é dura.
E sobretudo insegura:
“Suspeito de atividades subversivas foi detido ontem o poeta Casimiro de Abreu.”
“A Fábrica de Fiação Camboa abriu falência e deixou
sem emprego uma centena de operários.”
“A adúltera Rosa Gonçalves, depondo na 3ª Vara de Família, afirmou descaradamente: ‘Traí ele, sim. O amor acaba, seu juiz.’”
O anel que tu me deste
era vidro e se quebrou
o amor que tu me tinhas
era pouco e se acabou
Era pouco? era muito?
Era uma fome azul e navalha uma vertigem de cabelos dentes cheiros que traspassam o metal e me impedem de viver ainda
Era pouco? Era louco, um mergulho
no fundo de tua seda aberta em flor embaixo onde eu morria
Branca e verde
branca e verde
branca branca branca branca
E agora
recostada no divã da sala
depois de tudo
a poesia ri de mim
Ih, é preciso arrumar a casa
que André vai chegar
É preciso preparar o jantar
É preciso ir buscar o menino no colégio
lavar a roupa limpar a vidraça
O amor
(era muito? era pouco?
era calmo? era louco?) passa
A infância
passa
a ambulância
passa
Só não passa, Ingrácia,
A tua grácia!
E pensar que nunca mais a terei
real e efêmera (na penumbra da tarde)
como a primavera
E pensar
que ela também vai se juntar
ao esqueleto das noites estreladas e dos perfumes que dentro de mim gravitam feito pó
(e um dia, claro, ao acender um cigarro
talvez se deflagre com o fogo do fósforo
seu sorriso entre meus dedos. E só).
Poesia – deter a vida com palavras?
Não – libertá-la,
fazê-la voz e fogo em nossa voz. Po-esia – falar
o dia
acendê-lo do pó
abri-lo
como carne em cada sílaba, de-
flagrá-lo como bala em cada não
como arma em cada mão
E súbito da calçada sobe
e explode
junto ao meu rosto o pás-saro? O pás?
Como chamá-lo? Pombo? Bomba? Prombo? Como?
Ele
bicava o chão há pouco
era um pombo mas súbito explode
em ajas brulhos zules bulha zalas e foge!
como chamá-lo? Pombo?
Não:
poesia,
paixão
revolução
Ele
bicava o chão há pouco
era um pombo mas súbito explode
em ajas brulhos zules bulha zalas e foge!
como chamá-lo? Pombo?
Não:
poesia,
paixão
revolução
sexta-feira, 10 de maio de 2013
quinta-feira, 2 de maio de 2013
Chuva Interior
Um recado do genial Mario Chamie
Chuva Interior
Quando saia de casa
percebeu que a chuva
soletrava
uma palavra sem nexo
na pedra da calçada.
Não percebeu
que percebia
que a chuva que chovia
não chovia
na rua por onde
andava.
Era a chuva
que trazia
de dentro de sua casa;
era a chuva
que molhava
o seu silêncio
molhado
na pedra que carregava.
Um silêncio
feito mina,
explosivo sem palavra,
quase um fio de conversa
no seu nexo de rotina
em cada esquina
que dobrava.
Fora de casa,
seco na calçada,
percebeu que percebia
no auge de sua raiva
que a chuva não mais chovia
nas águas que imaginava.
Chuva Interior
Quando saia de casa
percebeu que a chuva
soletrava
uma palavra sem nexo
na pedra da calçada.
Não percebeu
que percebia
que a chuva que chovia
não chovia
na rua por onde
andava.
Era a chuva
que trazia
de dentro de sua casa;
era a chuva
que molhava
o seu silêncio
molhado
na pedra que carregava.
Um silêncio
feito mina,
explosivo sem palavra,
quase um fio de conversa
no seu nexo de rotina
em cada esquina
que dobrava.
Fora de casa,
seco na calçada,
percebeu que percebia
no auge de sua raiva
que a chuva não mais chovia
nas águas que imaginava.
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